Tempos Históricos

      Assim, na evolução humana, a utilização dos registros impressos, sejam os pictogramas rupestres, sejam os primeiros símbolos literais dos fonemas, tornaram-se indispensáveis às relações sócio-econômico-culturais. Charles Higounet observa uma relação inseparável no triângulo história-escrita-homem: A escrita faz de tal modo parte da nossa civilização que poderia servir de definição dela própria. A história da humanidade se divide em duas imensas eras: antes e a partir da escrita. (...) Vivemos os séculos da civilização da escrita. Todas as nossas sociedades baseiam-se sobre o escrito. A lei escrita substitui a lei oral, o contrato escrito substituiu a convenção verbal, a religião escrita se seguiu à tradição lendária. E, sobretudo não existe história que não se funde sobre textos (HIGOUNET, 2003). O legado das cavernas     dada a inexistência de organização e padronização nas representações gráficas das pinturas rupestres, estas não são consideradas exatamente escrita, mas criptografias aleatórias que pretendem transmitir sua mensagem, gravadas em um material da natureza. 
     Por isso mesmo, é possível fazer uma analogia entre aquelas gravuras e a escrita: ambos os casos buscam registrar algo, de alguma forma, para determinado grupo, para aquele momento ou para a posteridade. A antropóloga Cláudia Pires afirma:Sobre a relação entre a «linguagem simbólica» – expressa através de símbolos abstractos pintados – e a sua intenção, digamos que foi através destas imagens que o homem entendeu que podia fazer passar uma mensagem, um pensamento, o seu estado de espírito, etc. Estas pinturas demonstram o valor que os homens da pré-história conferiam às suas criações. O conjunto destes desenhos-escrita, passíveis de serem compreendidos por todos os membros de um mesmo grupo, tomam a designação de pictogramas. Pertencem, pois, ao conjunto das escritas pictográficas, que no grego significam descrição da imagem, para servir de símbolo. (PIRES, www.revista-temas.com) (negritos nossos). 
     As semelhanças entre as pinturas paleolíticas e a escrita também estão nos instrumentos e suportes para execução de ambas as técnicas, que trazem a mesma idéia principal, em dois momentos distantes entre si cerca de milhares de 3 anos: um objeto com o qual se vai desenhar ou escrever (utilizando para isso pedra, materiais inorgânicos e orgânicos à base de tintas vegetais e minerais, e pena, caneta ou lápis) e outro no qual será registrado o assunto pretendido (a rocha ou um papel). Com esses instrumentos, os homens das cavernas foram os primeiros a dispor de um tipo de registro usado até hoje, a ideografia, cujo grande número de símbolos que a compõem permite que seja utilizada e interpretada em qualquer lugar onde seu significado seja correspondente, como os desenhos das placas de trânsito, por exemplo.
     Portanto, as figuras rupestres talvez representem o mais remoto exemplo de que um registro impresso adquire preeminência sobre a oralidade, no que diz respeito a uma mensagem escrita permanecer o máximo possível em seu estado representativo original, suportando o tempo e condições naturais do ambiente, e permitindo que gerações milênios mais tarde apreciem e teçam conjecturas sobre uma forma social que não deixou outro vestígio, em vida, de como o homem primitivo se comportava e como observava seu meio ambiente. A arte primitiva é um legado de inscrições em rochas que desafiou o tempo, sobrevivendo há milhares de anos e ainda transmitindo informações sobre uma civilização inexistente, mesmo depois do surgimento da escrita como um marco da História. Vários começos A escrita causou uma revolução tão significativa nas comunicações, que os historiadores estabeleceram o encerramento da Pré-História e o nascimento da História no período em que o homem começou a escrever. 
    Mas essa passagem histórica não se deu ao mesmo tempo em todas as partes do nosso planeta. Somente muitos milênios depois a Pré-História findou na América, na África Central e na Austrália, com a conquista dessas regiões pelos europeus, a partir do século XV. Isso demonstra que por mais de cinco mil anos, a escrita manteve-se na vanguarda como um dos marcos iniciais da História. Segundo Fábio Costa Pedro e Olga M. A. Fonseca Coulon (1989), o fim da Pré-História ocorreu primeiramente no Oriente Próximo, com o surgimento da escrita ligado à evolução das primeiras civilizações urbanas, na região entre os rios Tigres e Eufrates, na Mesopotâmia, cerca de 40 séculos antes da Era Cristã. Com essa reputação, a escrita adquiriu autonomia e independência, tornando-se objeto de necessidade de domínio mundial. Também transcendeu em fama aos seus inventores e aos que a têm aperfeiçoado no processo contínuo da evolução das civilizações.
    Conforme José Juvêncio Barbosa, seus criadores são completamente desconhecidos. Ironicamente, não há informações de que seus idealizadores, criadores, nem os grupos especializados que a aprimoraram ao longo da história, deixaram registrados seus nomes em algum objeto, utilizando seu próprio invento. Apesar desse anonimato, Barbosa afirma que a invenção da escrita é um dos fatos responsáveis pelos desenvolvimentos na antiguidade: Na realidade esta, como muitas “invenções” do gênio humano, pode ser 
considerada como aprimoramento de algo que já era anteriormente conhecido. Infelizmente não conhecemos o nome de nenhum dos autores das reformas mais importantes na história da escrita. Seus nomes, como o de tantos outros grandes homens, responsáveis por melhorias essenciais da vida humana (como por exemplo o uso prático da roda, do arco e flecha, da embarcação a vela) perderam-se para sempre no anonimato da Antiguidade. (BARBOSA, 1991, p. 34).
  Apenas se conhecem épocas, povos e locais de onde se deram os primeiros registros escritos, os chamados cuneiformes, desenvolvidos pelos sumérios na Mesopotâmia, por volta de 4.000 a.C., embora alguns historiadores situem seu aparecimento há mais de seis mil anos. Barbosa (p. 35) afirma que “o primeiro registro que se conhece é uma pequena lápide, encontrada nos alicerces de um templo em Al Ubaid. O construtor do templo escreveu nela o nome do seu rei. Esse rei pertenceu a uma dinastia entre 3150 e 3000 a.C.”. “Mil e uma utilidades” históricas a existência da escrita distingue-se como um marco das formas de expressão, não apenas por sua capacidade de registrar a História, representar a fala ou idéias, ser apreendida e decodificada pelo entendimento humano, mas também por ultrapassar limites geográficos, sobreviver épocas, ajudar a construir ou desconstruir culturas, universalizar religiões, idéias, pensamentos, sofrer mutações pelas mais diversas causas, entre elas as transliterações e as traduções, e, ainda assim, ter a possibilidade de permanecer como originalmente foi produzida.
   O desenvolvimento dos métodos de agricultura e do comércio, e as distâncias entre as cidades entre as quais se estabeleciam relações de troca, são tidos como os responsáveis pelos primeiros registros escritos, ante a necessidade de controle administrativo, de registros contábeis e de se saber com exatidão onde se situavam os distantes pontos de abastecimento e quais as rotas a seguir para os alcançar. Conseqüentemente, se tornou imprescindível o desenvolvimento de sistemas de pesos e medidas, só possíveis com recurso à matemática, – que implica também alguma forma de notação gráfica –, e de mapas e cartas. Assim, a escrita teria sido criada primeiramente para atender a uma necessidade prática de informação agro-comercial, em vários lugares. Lévy estabelece paralelos entre o desenvolvimento da agricultura e o da escrita, ambas como reformuladoras de conceitos de tempo e espaço, e esclarece que o surgimento da escrita não foi um fato causado por uma única sociedade: A escrita foi inventada diversas vezes e separadamente nas grandes civilizações agrícolas da Antigüidade.
   Reproduz, no domínio da comunicação, a relação com o tempo e o espaço que a agricultura havia introduzido na ordem da subsistência alimentar (LÉVY, 1993, p. 87). A relação da escrita com a agricultura é apenas um dos aspectos evidenciados por Lévy, cuja visão analógica  e até poética – relata uma semelhança entre esses dois processos do Neolítico, a agricultura e a técnica de impressão em argila, demonstrando as suas características em comum, sintetizando séculos de uma relação entre tecnologia da escrita e processo agrário: O escriba cava sinais na argila de sua tabuinha assim como o trabalhador cava sulcos no barro de seu campo. É a mesma terra, são instrumentos de madeira parecidos, a enxada primitiva e o cálamo distinguindo-se quase que apenas pelo tamanho.
     O Nilo banha com a mesma água, a cevada e o papiro. Nossa página vem do latim pagus, que significa o campo do agricultor. (LÉVY, 1993, p. 87-88). Além de registrar graficamente os movimentos agro-comerciais daquelas civilizações, os símbolos impressos tiveram suas aplicações em outras esferas das atividades do homem, onde diversos conhecimentos começaram a ser desenvolvidos, como a Astronomia, o Direito, a Poesia etc., muitos dos quais  outros aspectos são a relação da escrita com o Estado, com a tradição hermenêutica, com o saber teórico, com a organização dos conhecimentos, com a racionalidade, com a História, a memória e a verdade, entre outros. Para saber mais: As tecnologias da inteligência, capítulo “A escrita e a História”. 6 puderam ter condição de deixar seus locais originais graças às inscrições, e posteriormente puderam ser reproduzidas com o auxílio de outras técnicas, transcorrendo tempo e espaço e permanecendo através da cronologia: A escrita abriu um espaço de comunicação desconhecido pelas sociedades orais, no qual tornava-se possível tomar conhecimento das mensagens produzidas por pessoas que encontravam-se a milhares de quilômetros, ou mortas há séculos, ou então que se expressavam apesar de grandes diferenças culturais ou sociais (LÉVY, 2000, p. 114).
    Para exemplificar a evolução dos registros gráficos resume-se aqui sete momentos da humanidade nos quais se formaram e evoluíram sistemas e algumas técnicas de escrita. Citam-se aqui exemplos de algumas performances das mais imprescindíveis na evolução da escrita e no seu serviço prestado às civilizações. Das atividades sócio-econômicas da Mesopotâmia, do ritualismo Egípcio, dos alfabetos do Oriente Médio, Fenício, Grego, do Império Romano até a formação da língua portuguesa, veremos que essa evolução influenciou fortemente a formação da língua e até a própria formação de nações. Ciências e literatura na Mesopotâmia, o principal uso da escrita cuneiforme foi na contabilidade e administração, como registro de bens, marcas de propriedade, cálculos e transações comerciais. Essas informações eram gravadas em tabletes de argila com estiletes. Mas outras atividades se estabeleceram auxiliadas pela escrita, como a Astronomia, o Direito e a Literatura. Textos sobre o movimento dos astros e calendários mesopotâmicos 
escritos entre 650 e 50 antes da nossa Era, chegaram até os dias atuais conservados em tábuas de argila.        Consistem em diários sobre astronomia e constituem umas das primeiras observações de especialistas: escribas-astrônomos profissionais, que usavam um conjunto de 30 estrelas como referências para posições celestes. Seus diários detalhavam as localizações da lua e planetas com relação às estrelas. Na área do Direito, um código de leis da Mesopotâmia representa um dos mais notáveis impressos. Sob as ordens de Khammu-rabi (Hammurabi), rei da Babilônia, 282 cláusulas foram gravadas em 21 colunas, conhecidas como Código de Hamurábi, embora abrangesse também leis mais antigas. O código trata, dentre 7 outros assuntos, das classes sociais, do comércio, da família (divórcio, o pátrio poder, a adoção, o adultério, o incesto), do trabalho (precursor do salário mínimo, das categorias profissionais, das leis trabalhistas), e da propriedade. Uma rápida percepção leva facilmente à constatação de que questões de direito da atualidade já eram levadas a juízo desde a antiguidade, e isso é possível de ser verificado graças à leitura dos símbolos gravados nas colunas.
   Tem-se no Poema de Gilgamesh contribuição das mais importantes da escrita à arte literária. Considerado a obra-prima da literatura suméria, trata-se de uma narrativa épica dos feitos do rei-herói Gilgamesh, que viveu por volta de 2700 a.C., na antiga cidade de Uruk (a Erech bíblica), na Mesopotâmia. Foi o sexto rei após o Dilúvio. No poema consta que, após retornar de suas viagens, o próprio rei o escreveu, numa estela3 de pedra que colocou na base das muralhas de Uruk. Teria sido escrito poucos séculos (quatro a seis) após a invenção da escrita. Este é talvez o primeiro personagem a registrar sua história. As escritas sagradas do Egito Os egípcios possivelmente foram responsáveis por introduzir a primeira redefinição no suporte e formas da escrita em relação ao processo cuneiforme. Diferentemente dos sumérios que cunhavam suas inscrições de formas triangulares em tábuas de argila, os egípcios usavam a forma material do livro, com o uso do papiro em forma de rolo, o emprego da tinta e a utilização das ilustrações como complemento explicativo do texto. Eles possuíam duas formas de escrita: os hieróglifos (figuras entalhadas sagradas), e a escrita hierática, de uso mais fácil e mais corrente, que permitia fazer anotações rápidas. Os hieróglifos eram sinais sagrados gravados (do grego hieros, “sagrado”, e glypheinI, “gravar”) que os egípcios consideravam ser a fala dos deuses (...) essa era uma escrita de palavras (HIGOUNET, 2003, p. 37). O sistema egípcio de escrita já reproduzia quase que totalmente a língua falada, pois alguns dos seus pictogramas já representavam sílabas. Além dos pictogramas, era formado por fonogramas (representação de sons) e outros signos determinantes. 
   Naquela civilização, a escrita está estreitamente ligada aos registros  Pedra vertical monolítica, em que os antigos faziam inscrições ou esculturas. De rituais sagrados, colheitas, estações e movimento de cheia e vazante do Nilo. Por seus fonogramas, podemos dizer que a escrita egípcia já constituía uma idéia mais ou menos aproximada de um alfabeto, pois já trazia uma característica de representações silábicas. Durante séculos os hieróglifos permaneceram enigmáticos, até o francês François Champollion decifrar a Pedra de Rachid4 (Roseta, em árabe) descoberta pelas tropas de Napoleão em 1822. Entretanto, passaram-se 23 anos desde a data de sua descoberta até que Champollion pudesse decifrar integralmente o seu conteúdo. A Pedra de Roseta é talvez o primeiro objeto com inscrição poliglota da História. Na parte superior, há uma escrita hieroglífica com 14 linhas; o texto intermediário contém 22 linhas de uma escrita egípcia cursiva, conhecida como demótico. A terceira divisão da pedra é ocupada por uma inscrição de 54 linhas em língua e caracteres gregos. Higounet considera essa escrita uma das mais importantes do mundo antigo. Apesar de seu emprego ter ficado limitado à língua e regiões egípcias, a decifração da Pedra de Roseta marca uma das maiores contribuições do Egito à História, pois tornou possível a decodificação de outras inscrições antigas. 
   Sobre as origens do alfabeto Segundo Higounet, “o alfabeto pode ser definido como um sistema de sinais que exprimem os sons elementares da linguagem” (2003, p. 59). Este sistema, com suas técnicas e instrumentos, configura outra redefinição no processo da comunicação escrita, que não consiste primeiramente na invenção de uma série de signos gráficos, mas na decomposição da palavra em sons simples, em que cada qual é representado por um só signo. Não mais a pictografia, ou a ideografia, desenhos representando idéias, mas sinais que, evoluindo daqueles desenhos, representam diretamente os sons da fala. Cagliari demonstra algumas evoluções de formas pictográficas que mais tarde se tornariam as letras do alfabeto como as conhecemos hoje:  Consiste numa estela de basalto negro, que numa das faces, bem polida, mostra três inscrições em três caracteres diferentes. Os três textos reproduzem o mesmo teor de um decreto do corpo sacerdotal do Egito, reunido em Mênfis, em 196 a.C., para conferir grandes honras ao rei Ptolomeu V Epifânio (205 a 180 a.C.), por benefícios recebidos. O a era a representação da cabeça de um boi na escrita egípcia. Em grego, o alfa se escreve α. O b era a representação de uma casa egípcia. 
O d era a figura de uma porta. O m era o desenho das ondas da água. O n era o desenho de uma cobra. O era a figura de um olho. O x representava o peixe, e assim por diante. (CAGLIARI, p. 108) O Alifato e seus derivados Uma representação mais próxima de um alfabeto surgiu com o aparecimento do Alifato5, que ao contrário dos escritos egípcios, não se restringiu a uma região. O Alifato se configurou na Síria, Fenícia e Palestina, constituído por 28 letras e escrito da direita para a esquerda e também derivou outros sistemas de escrita. Era dividido em dois subgrupos: o fenício, que derivou o alfabeto grego; e o aramaico, derivando o alfabeto hebreu e o árabe.
    As vogais não eram totalmente representadas em alguns desses alfabetos6. Este sistema de escrita incide decisivamente na história das grandes religiões. Traduzindo os textos sagrados de seus derivados aramaico e hebreu, transcreveu alguns textos dos livros do Antigo Testamento. Fenícia, berço dos alfabetos? A Fenícia se situava na planície costeira do que é hoje o Líbano e a Síria, no Mediterrâneo oriental (Wikipédia, verbete Fenícia). O historiador grego Heródoto atribui aos fenícios as primeiras inscrições de fato alfabéticas (Nicholas Fabian, www.kfssystem.com.br/loubnan/fenicio.html), mas pesquisas atuais têm mostrado vestígios de um alfabeto anterior, chamado escrita proto-sinaítica, utilizado na península do Sinai. O alfabeto fenício apareceu pela primeira vez em Biblos7 e é considerado a origem dos alfabetos atuais. Apesar do pretenso pioneirismo fenício, não há literatura ou registros escritos em materiais resistentes ao desgaste do tempo. O que se sabe da sua escrita provém de curtas inscrições em pedra. Com os dados que se apresentam hoje, pode-se entender que a construção das palavras, assim como o 5 Primórdio do alfabeto árabe. Sua letra inicial, o alif, origina o seu nome. 6 Permita-se aqui um parêntese interessante: há uma semelhança entre a escritas hebraica e algumas palavras nos chats da Internet. O alfabeto hebraico não possuía vogais. Nos chats, por questão de dinâmica, palavras como “também”, “você” e “beijos”, não só perderam as vogais, como algumas consoantes, mas que são perfeitamente compreensíveis pelos internautas. 
7 Primeira cidade fenício-libanesa estabelecida, situada 37 quilômetros ao norte de Beirute. Nela, Cadmo
inventou o alfabeto fonético. O nome Biblos tem origem na comercialização intensa do papiro na cidade. Biblos deu seu nome à Bíblia.
 10 alfabeto árabe e o hebraico, não tinham símbolos para representar sons de vogais. Cada símbolo representa uma consoante. As vogais precisavam ser deduzidas no contexto da palavra. Com 22 sinais, esse alfabeto foi utilizado por volta do final do século 12 antes de Cristo. Consistia-se em sinais com precisão de formas, que dispostos ordenadamente em determinada combinação representavam graficamente, cada 
um, o respectivo som dos fonemas de uma linguagem oral. Por essas qualidades, muitos historiadores consideram que este alfabeto, composto de vinte e duas consoantes, chegou próximo da perfeição: 
Em seu livro “O Choque do Futuro”, Toffler afirma que 95% das invenções do homem se realizaram no decorrer do Século XX. Entre os 5% dos tempos antigos, figura o alfabeto fonético de Biblos. A invenção desse alfabeto operou uma revolução. Com menos letras, obtém-se maior precisão e mais clareza. Podemos descrever os sentimentos da alma, analisar o pensamento. As outras escritas não podiam propiciar essa 
fidelidade absoluta. (Extraído do texto O Alfabeto, do site www.libano.org.br/pagina47.htm , da embaixada do Líbano no Brasil). Os paleógrafos8 acreditam que os fenícios foram responsáveis pela expansão desse sistema de escrita pelo mundo antigo. Pode-se afirmar que o assunto vagueia entre o real e o mítico, na história do rei Cadmo9. Nessa história, alfabeto e poder militar são intrínsecos, como expressa Emanuel Dimas de Melo Pimenta: “Cadmo, o mitológico rei que terá introduzido as letras do alfabeto na 
Grécia, semeou os dentes de um dragão com o qual lutara. Desses dentes nasceram homens fortemente armados”. Cadmo não sabia como controlá-los e tratou de atirar pedras, de forma tribal, sem planos, aleatoriamente, fazendo com que aqueles homens desconfiados de si próprios matassem uns aos outros. 
Só depois, com apenas cinco sobreviventes, Cadmo conseguiu assumir a autoridade da liderança. Comomostrou McLuhan, o alfabeto significava para a Grécia Antiga o poder, a autoridade e o controle de estruturas militares a distância. Cadmo representa uma transição de tecnologias. Os dentes do dragão 
semeados geraram o poder que acabou com as cidades-estado e que permitiu a exuberância do Império Romano. Foi o "ruído" produzido pelas pedras de Cadmo o responsável pela desarticulação daquele exército”. (trecho de Natureza, artefactos e percepção sensorial). 8 Especialistas na arte de decifrar escritos antigos. 9 Cadmo é um misto de personagem real e mitológico. Filho do Rei da Fenícia, foi o primeiro rei de Tebas, cidade fenícia. Segundo a tradição grega, Cadmo legou aos gregos o uso do alfabeto, ensinando-lhes a ler e a escrever. 11 Embora a mitologia propale que Cadmo seja o herói que inventou e difundiu o
alfabeto, uma versão, menos abstrata, porém bem possível, é a de que os gregos – assim como outras civilizações – tivessem mais facilidade de apropriação do alfabeto fenício em relação aos demais alfabetos por uma questão prática de contato comercial com aquele povo. Os fenícios eram os mais desenvolvidos na 
técnica das embarcações e no comércio, o que permitia manter intenso comércio marítimo com outros povos: Ora, o comércio é a atividade econômica que mais exige o registro de suas transações: assinaturas de contratos, recibos de mercadorias etc.
     Assim, da necessidade de simplificar as escritas já existentes (egípcia e mesopotâmica) surgiu o alfabeto fenício, que tornou possível uma difusão maior da habilidade de escrever, até então privilégio de uma minoria. (AQUINO e outros, 1980, p. 123). De fato, os avanços tecnológicos marítimos possibilitaram o desenvolvimento do comércio, e tanto, que Rubim Santos Leão de Aquino (1980, p. 122) recorre a uma passagem bíblica advertindo a soberba dos fenícios, por causa do desenvolvimento comercial e marítimo: “(...) foste cheia de bens e te glorificaste muito no meio dos mares” (Livro do profeta Ezequiel, 27, 25). Aquino também sugere uma relação entre os processos avançados da 
escrita e uma outra advertência onde “Pela extensão da tua sabedoria, pelo comércio aumentaste o teu poder; e eleva-se o teu coração por causa do teu poder” (Ezequiel, 28, 5. Itálicos do autor). Uma análise sobre este versículo e um questionamento de Aquino sugere que estão implícitas as relações entre o domínio da escrita e o poder. O autor interage com o leitor: “Agora, pense um pouco... Seria essa maior difusão da 
habilidade de escrever que Ezequiel procurou expressar quando falou: “pela extensão da tua sabedoria”? Talvez sim, talvez não, mas não deixa de ser uma forma de interpretá-la. Você teria outras?” (p. 123). 
Alfabeto grego: a inovação das vogais De qualquer forma, “o mais famoso resultado desse processo é o alfabeto grego, em grande parte devedora da invenção fenícia” (www.israel3.com/ftopict-1227.html). Segundo Rubem Alves, os filósofos gregos foram os pioneiros .

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