REFLEXÕES
SOBRE PRÁTICA DOCENTE E FEIRAS CIENTÍFICAS ESCOLARES: EXPERIÊNCIAS A PARTIR DE
PROJETOS DE GEOGRAFIA
Wagner
Batella, Annelise Schmidt, Claudia Tosatti Piovesan, Bernardo Luza.
Resumo:
As
feiras científicas escolares representam um momento importante do calendário
escolar de muitas escolas de educação básica. Não apenas por propiciar a
interação com a comunidade, mas também por ser um importante espaço para o
desenvolvimento de diversas habilidades pelos estudantes. Esses eventos, que
muitas vezes não ocorrem em espaços formais de sala de aula, contribuem para a
formação de uma cultura de pesquisa e permitem que os professores elaborem
práticas voltadas para o acompanhamento de projetos temáticos elaborados pelos
alunos. Este texto objetiva tecer considerações sobre as feiras científicas
escolares e as práticas docentes. Para isso, relata a experiência vivida no
âmbito do Subprojeto PIBID de Geografia da UFFS e dos projetos elaborados para
apresentação na Feira de Ciências da Escola de Educação Básica Coronel Lara
Ribas, em outubro de 2012. A partir dos conteúdos trabalhados com alunos do
oitavo ano, a supervisora e os bolsistas elencaram dois temas: 1) as obras de
engenharia do século XX sob o interesse geopolítico e econômico; 2) os impactos
ambientais e suas possíveis soluções. Considerando esses temas, a equipe do
PIBID, juntamente com os alunos da escola, escolheram as propostas de trabalhos
que seriam elaborados e apresentados na feira. São eles: a) o muro de Berlim e
suas implicações; b) a ferrovia Transiberiana; c) o Eurotúnel; d) Rio Tâmisa:
poluição e processo de despoluição; e) Mar de Aral e sua degradação. A
preparação envolveu a redação de um projeto, que foi discutido em reunião com
toda a equipe do subprojeto de Geografia, a orientação aos alunos da escola na
construção dos trabalhos, elaboração de maquetes, seleção de filmes, ambientação
de uma sala que remetesse ao contexto da Berlim durante a Guerra Fria e o
planejamento da apresentação realizada durante a feira. A reflexão que se apresenta
revela o contexto das feiras como importante momento para se exercitar a
autonomia e a curiosidade científica dos alunos, o que exige dos professores
práticas diferenciadas que incentivem e promovam o trabalho coletivo.
Palavras-chave:
Prática Docente; Feiras Científicas Escolares; Projetos de Geografia.
Introdução
O
Subprojeto Geografia do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência – PIBID – da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS – foi
elaborado com o fito de garantir formação de qualidade aos acadêmicos do curso
de Geografia Licenciatura do campus Chapecó-SC
participantes desse subprojeto. Os professores responsáveis pela elaboração do subprojeto
comparavam-no às experiências de residência vivenciadas pelos acadêmicos de
cursos de medicina. Tal qual essa visa uma formação de qualidade para os
futuros médicos, o PIBID tem por objetivo subsidiar a qualificação dos futuros
professores, criando condições para acompanharem, discutirem e exercitarem a
prática docente enquanto ainda frequentam o curso de graduação.
Destarte,
as práticas foram previstas no subprojeto de forma a possibilitar a articulação
dos conhecimentos apreendidos na universidade e no cotidiano escolar, de forma
a favorecer experiências relacionadas à docência aos professores em formação
inicial. Dentre as práticas sugeridas no subprojeto, destacam-se duas
particularidades: o uso de linguagens da cartografia (com destaque para os
mapas e as maquetes) como metodologia para se trabalhar conteúdos da geografia
e a valorização de práticas em espaços de ensino não formais, ou seja, fora da
sala de aula. Diante disso, a feira de ciências organizada pela escola parceira
no projeto despontava como o contexto propício para realização de tais
práticas.
O
objetivo deste texto é relatar essa experiência que envolve práticas docentes nas
quais os alunos se tornam sujeitos do processo de aprendizagem, com autonomia
para construção de projetos que foram socializados na feira de ciências. Os
resultados revelaram ganhos significativos no processo de ensino-aprendizagem,
com destaque para o desenvolvimento de habilidades de pesquisa entre bolsistas
e alunos da escola.
O
texto encontra-se dividido em três partes, além desta introdução. Na primeira
apresenta-se, ainda que de maneira sucinta, os referenciais teóricos que
balizaram o trabalho. Na segunda parte realiza-se um relato que mescla aspectos
metodológicos das atividades realizadas, envolvendo tanto a fase de preparação
quanto aquela voltada à execução, e uma análise dos resultados obtidos. Por
fim, na terceira parte elabora-se uma reflexão sobre a experiência vivida nesta
prática, avaliando-a na perspectiva da formação inicial dos futuros
professores.
Geografia
escolar, as práticas docentes e as feiras científicas
A Geografia é uma
ciência que tem sua origem calcada sob o caráter tradicional, sobretudo servindo
ao poder e sua forma descritiva da realidade a qual camuflava sua importância
(LACOSTE, 1988). Os reflexos dessa fase da Geografia foram perceptíveis em sala
de aula, uma vez que sua função ideológica, tanto no ensino escolar quanto
universitário, “foi, sobretudo de mascarar, através de processos que não são
evidentes, a utilidade prática da análise do espaço” (SILVA; SILVA, 2012, p.130).
Não era pouco comum
encontrar docentes que, em suas práticas didáticas, privilegiavam a memorização
e a descrição dos elementos que compõem a paisagem, tornando a Geografia um
campo marcado pelo seu caráter enciclopédico e distante de uma formação
política de seus alunos. O surgimento do paradigma da Geografia Crítica teve
reflexos imediatos na geografia escolar, rompendo com a suposta neutralidade
dessa disciplina e tornando seu ensino um instrumento para questionamento da
ordem vigente. Essa proposta não passou incólume às críticas de sua politização
exacerbada e de tentativa de redução do espaço geográfico, objeto de estudo da
Geografia, à dimensão econômica.
Essa rápida discussão
mostra como a Geografia, desde seu surgimento como campo científico e como
disciplina escolar, passou por transformações que demandavam novas práticas por
parte de seus professores. O período atual abre novos desafios para esses
profissionais.
De uma forma geral, educar
e ser professor na atualidade requer uma formação permanente e continuada,
voltada para articular teoria e prática num mundo digital e colorido para uma
grande maioria das crianças brasileiras. Para superar o atraso tecnológico, a
prática docente tradicional requer, além de uma boa formação, métodos
audaciosos e muitas horas além da carga horária do professor da educação básica
para implementar uma metodologia voltada para articulação de projetos
interdisciplinares ou não, capazes de
motivar e movimentar os alunos na direção de buscar a significação ou
resignificação dos conceitos e conteúdos desenvolvidos ou propostos pelo
professor.
A metodologia voltada
para projetos apresentam inúmeras possibilidades de qualificar o conhecimento,
melhorar a interação alunos-alunos e alunos-professores, desenvolver a
capacidade de comunicação entre esses, além de estimular a busca pelo
conhecimento, pela descoberta, iniciativa e criatividade. Muitos desses
aspectos são revelados durante a realização e apresentação dos projetos
propostos, que muitas vezes surpreendem o professor, pelas habilidades e
competências reveladas pelos alunos. O olhar do professor muda
significativamente e isto interfere na avaliação, pois permite uma visão mais
global do processo de ensino-aprendizagem.
É preciso dizer, como
fez Torgal (2008), que o sistema estruturado nas escolas contemporâneas, ou
seja, da educação básica, assenta-se numa lógica fabril, pois os docentes se
sentem presos a aulas individuais de 50 minutos, sem tempo de planejamento
adequado, num atraso de tecnologias, sem suporte pedagógico na escola e tempos
exímios para provas, notas e cadernetas. Dessa maneira, parece que os
professores encontram-se numa produção em série, onde o que se busca é a mera produtividade.
Esta forma de
organização e estruturação limita o trabalho diferenciado do professor quando
se deseja, por exemplo, trabalhar com seus alunos em espaços de ensino não
convencionais, como as feiras científicas. Esses eventos, no âmbito da escola,
auxiliam na produção do conhecimento contextualizado e relacional, que exige um
tempo maior de planejamento, organização, de elaboração e de interação com
outras disciplinas. Apesar das dificuldades em se operacionalizá-las, as feiras
científicas escolares se apresentam como possibilidade de novas práticas
docentes que fomentam um ensino diferenciado através da elaboração de projetos.
O ensino por projetos
implica em um olhar diferente do docente em relação ao aluno, sobre seu próprio
trabalho e sobre o rendimento escolar. O ensino por projetos envolve planejar,
desenvolver e avaliar atividades, condições que podem ser estruturadas nas
seguintes fases: problematização, sensibilização, viabilização, implementação e
consolidação para as feiras de ciências, que se constituem palcos para um ensino
onde o aluno é sujeito do processo.
A metodologia de ensino
por projetos, componente estruturante da feira de ciências, constitui ainda em
uma oportunidade ímpar para a formação continuada de professores, pois envolve as
etapas anteriormente descritas, sendo que, em todas elas, os professores se
deparam com desafios que precisam ser discutidos coletivamente. Isso comprova
que as feiras de ciências têm assumido um papel importante dentro das escolas
no que diz respeito à aprendizagem e ao entendimento das etapas que envolvem a
construção do conhecimento científico (NEVES, 1989).
Descrição
das atividades durante a Feira do Conhecimento da Escola de Educação Básica
Coronel Lara Ribas
Os seis bolsistas do
PIBID, subprojeto de Geografia, participaram da Feira do Conhecimento da E.E.B.
Lara Ribas realizada em Chapecó no dia 27 de outubro de 2012.
As atividades
desenvolvidas foram divididas em quatro etapas. A primeira foi decidir os temas
para apresentação na feira. A partir dos conteúdos trabalhados com alunos do
oitavo ano, a supervisora e os bolsistas elencaram dois temas: 1) as obras de
engenharia do século XX sob o interesse geopolítico e econômico; 2) os impactos
ambientais e suas possíveis soluções. Considerando esses temas, a equipe do
PIBID, juntamente com os alunos da escola, escolheram as propostas de trabalhos
que seriam elaborados e apresentados na feira. São eles: a) Muro de Berlim e
suas implicações; b) Ferrovia Transiberiana; c) Eurotúnel; d) Rio Tâmisa:
poluição e processo de despoluição; e) Mar de Aral e sua degradação
Na segunda etapa, a
professora supervisora trabalhou os conteúdos em sala, os bolsistas nesta fase
somente acompanharam as aulas. Em
seguida, os alunos da escola apresentaram em sala de aula pequenos seminários a
respeito dos temas propostos nos projetos. Os grupos foram organizados pela
afinidade dos alunos com os temas e foi dada a eles a autonomia para escolherem
onde atuar.
Para a realização da
terceira etapa, os bolsistas se dividiram para auxiliar os grupos a rearranjar
os seminários para apresentação à comunidade escolar. Foram realizadas reuniões,
onde os estudantes puderam dar ideias e discutir os projetos. Nas reuniões
seguintes foi iniciada a confecção dos cartazes, maquetes e apresentações para
a Feira.
Com o acompanhamento
desta etapa, os bolsistas tiveram a oportunidade de visualizar os alunos
realizando saltos quantitativos no processo de aprendizagem até culminar em um
salto qualitativo surpreendente. Alunos que apresentavam grandes dificuldades
em sala de aula se sobressaíram e realizaram os trabalhos com muita facilidade
e entusiasmo.
O processo foi proposto
para que, com a interação de todos, se conseguisse construir um aprendizado de
maneira eficaz, o que ficou mais evidente na última etapa, que foi a
apresentação para a comunidade escolar, quando as salas, corredores e quadras
de esportes foram decoradas com o material preparado pelos grupos e os
visitantes recebiam as explicações dos próprios estudantes que mostravam com
clareza ter conhecimento a respeito dos projetos .
A Feira do Conhecimento
realizada na E. E. B. Coronel Lara Ribas em outubro de 2012 foi uma tentativa
de retomada de práticas pedagógicas que a escola já vinha realizando há anos de
forma significativa e que foram sendo abandonadas aos poucos. A experiência
vivida foi tão significativa que na reunião de planejamento do ano letivo de
2013 os professores decidiram pela continuidade da Feira do Conhecimento, que
será realizada no mês de agosto.
Considerações
finais
A
feira científica da E.E.B. Coronel Lara Ribas foi a primeira atividade
desempenhada pelos bolsistas de iniciação à docência nessa escola após a
ampliação do projeto, uma vez que esse já vinha sendo realizado em outra
instituição escolar.
Os projetos
apresentados na feira empregaram metodologias diversas, como o uso de maquetes,
vídeos, salas ambiente etc. e foram coordenados pelos próprios bolsistas, com
acompanhamento do coordenador e da supervisora.
A experiência de se
trabalhar com projetos foi muito positiva, como destacado na avaliação final
realizada após a feira. Os envolvidos com os projetos apontaram que se sentiram
integrantes das atividades na medida em que iam propondo elementos que se
incorporavam às propostas. As bolsistas corroboraram essa percepção e reforçaram
que os próprios alunos da escola assumiam a frente das apresentações durante a
feira, tornando-se protagonistas do processo.
Finaliza-se este texto
com uma análise do papel dessa atividade para a formação inicial dos futuros
professores. Além de permitir e incentivar o senso de pesquisa nos bolsistas,
pode-se trabalhar a importância de metodologias baseadas em projetos, nas quais
os alunos são sujeitos do processo e onde se buscam os espaços de ensino que diversifiquem
o cotidiano da escola.
Referências
bibliográficas
LACOSTE,
Yves. A geografia, isso serve, em
primeiro lugar, para fazer a guerra. Trad. Maria Cecília França. Campinas:
Papirus, 1988. 263p.
NEVES,
Selma Regina Garcia. Feiras de ciências. Caderno
Catarinense de Ensino de Física, Florianópolis, vol. 6, n. 3, dez. 1989,
pp. 241-248.
SILVA,
Maria do Socorro Ferreira; SILVA, Edimilson Gomes. Um olhar a partir da
utilização de dinâmicas como ferramenta para o ensino da geografia escolar. Caminhos da Geografia, Uberlândia, v. 13,
n. 44, Dez/2012, pp. 128-139.
TORGAL,
Luis Filipe. A escola pública e o fordismo. Educare.pt.
Disponível em: http://www.educare.pt/educare/Opiniao.Artigo.aspx?contentid=572ED9108C9C6FB1E0400A0AB8005DEB&opsel=2&channelid=0.
Publicado em 2008. Acesso em: 05/06/2013.
[1] Texto elaborado a partir das
experiências vivenciadas no âmbito do subprojeto de Geografia do Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID) da Universidade Federal
da Fronteira Sul (UFFS). Os autores agradecem à CAPES pelo financiamento do
projeto.
[2] Coordenador (junho/2011 a
dezembro/2012), supervisora e acadêmicos bolsistas do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência, UFFS, Campus
Chapecó-Sc, Subprojeto de Geografia. Contatos: wagner.batella@uffs.edu.br, schmidtane@yahoo.com.br, clautosatti@yahoo.com.br e bernardoluza@hotmail.com
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